Nas últimas décadas, a historiografia da educação vem colocando o foco na caixa preta das escolas com o intuito de compreender como a cultura escolar prescrita é colocada em movimento nas escolas. Uma boa justificativa para essa virada teórica é o fato de as reformas educacionais muitas vezes serem empobrecidas pela mediação dos/as professores/as.
A tendência à micro-análise histórica em torno da cultura escolar desdobrou-se na história das disciplinas ou matérias escolares – ou ainda melhor das “disciplinas-saber”. Assim, no Brasil, há inúmeros trabalhos acadêmicos instigantes que versam sobre a história da Língua Portuguesa, da Matemática, da Geografia, da Química, entre outras. Nessas histórias geralmente são consideradas as operações de prescrição das “disciplinas-saber”, bem como as suas vidas efetivas em sala de aula, pois, como diz Keddie, “as matérias escolares não são outra coisa senão aquilo que as práticas fazem delas”. Nesta direção, no início do presente ano letivo, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina, foi defendida a tese de doutorado intitulada “A Educação Física no Estado de Santa Catarina: a construção de uma pedagogia racional e científica (1930-1940)”, de Ticiane Bombassaro. Trata-se de um trabalho inédito e de fôlego sobre a introdução e a estruturação da disciplina Educação Física Escolar em Santa Catarina, destacando a formação de professores, a apropriação dos diferentes métodos e a questão polêmica da introdução de jogos e esportes nessa disciplina. A Educação Física Escolar nas décadas de 1930 e 1940 é contextualizada na “Era Vargas”, marcada pela nacionalização autoritária e pela implantação de estratégias biopolíticas de controle da população. A tese de Ticiane revisita a prática de ginástica em associações desportivas e em escolas de imigrantes, especialmente aquelas de descendentes de alemães, e nos grupos escolares implantados, no início da década de 1910, pela Reforma Orestes Guimarães. No entanto, ela coloca o foco na década 30 do século XX, quando a disciplina Educação Física se consolida nos currículos escolares brasileiros, por meio da articulação dos militares. Em Santa Catarina, a disciplina Educação Física ganha importância na Reforma Trindade (1935) e, especialmente, com a criação do “Curso Provisório de Educação Fisica”, em 1938, na capital catarinense, destinado a formar professores de Educação Física. Nesse curso inédito houve nítida preferência pelo “Método Francês” e a Educação Física Escolar teve um claro objetivo de disciplinar e nacionalizar os corpos discentes. A leitura do trabalho de Ticiane sobre a introdução da Educação Física Escolar em Santa Catarina é oportuna e salutar no atual momento histórico, em que se verifica a disseminação de academias e a flexibilização da obrigatoriedade da prática da Educação Física em algumas escolas.
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