Precisamos de uma sociedade “educógena”
Por: em
A expressão
famílias educógenas foi utilizada pela primeira vez por Jean Floud, em 1961, no
texto “Social Class Factors in Educational Achievement”, editado pela OCDE. A
meu conhecimento, o único pesquisador brasileiro a fazer menção a ela é CASTRO
(1976) que a define como famílias que se caracterizam por oferecer
certo tipo de ambiente familiar favorável à educação (p. 73). Esse autor reconhece, entretanto, o
caráter vago dessa noção no texto original da OCDE, mas ressalta a conclusão da
autora inglesa de que esse tipo de família vai de tornando mais freqüente
conforme se sobe na escala social.
NOGUEIRA, Maria Alice. A categoria “família” na pesquisa
em sociologia da educação: notas preliminares sobre um processo de
desenvolvimento. Revista
Inter-Legere, v. 1, n. 9, 2013. (pagina 157).
Por causa da constatação de que o perfil educógeno das
famílias (o qual apresenta alta correlação com a renda, mas não dependente
dela, como se vê acima) pode ter um efeito no desempenho dos alunos para além
das escolas, as provas padronizadas costumam submeter os alunos que as
respondem a questionários de cunho sociológico para identificar este componente
(família educógena) e separá-lo do efeito da escola.
Isso se dá para que possa ser feita uma avaliação mais
justa das escolas e da diferenciação entre elas, inclusive nos famosos
rankings. Portanto, é importante conhecer o perfil de seus alunos. Quanto mais
famílias educógenas em uma escola, maior a chance de um desempenho médio mais
alto, pois mais famílias dão sua contribuição material e comportamental para o
sucesso acadêmico de seus filhos.
É por isso, por exemplo, que o Inep divulga o ENEM por
escola por faixas de Nível Sócio Econômico (NSE).
Mas para se determinar isso em larga escala, foi preciso
traduzir essa percepção em perguntas de questionário. As provas padronizadas no
Brasil também adotam essa prática, embora sejam mais concentradas em avaliar a
renda do que a prática educógena ou anti-educógena das famílias.
Resolvi usar os questionários do Pisa, que acho mais
abrangentes e lógicos para esse propósito, e fazer uma comparação. Em primeiro
lugar então, vamos ver o que é que o pessoal do Pisa resolveu perguntar aos
participantes do exame, para além dos itens de conforto e conexão com o mundo
que são mais comuns nos questionários brasileiros, com foco maior na
determinação da renda das famílias:
Próprio quarto
Software educacional
Internet
Dicionário
Lugar tranquilo para estudar
Escrivaninha
Livros de texto
Literatura clássica
Poesia
Obras de arte
Quantos livros em casa
Instrumentos musicais
Software educacional
Internet
Dicionário
Lugar tranquilo para estudar
Escrivaninha
Livros de texto
Literatura clássica
Poesia
Obras de arte
Quantos livros em casa
Instrumentos musicais
Fiz uma comparação entre países da Europa e América do
Norte e os da América Latina participantes do Pisa e reforcei o que já
esperava: os alunos de países desenvolvidos contam com domicílios muito melhor
preparados para o bom desempenho escolar que os da América Latina. Todos esses
itens estão relacionados a enormes diferenças de desempenho quando o aluno
responde sim ou não sobre tê-los à disposição em casa. O que faz mais diferença
é a quantidade de livros em casa: a diferença em ter poucos (0-15) e mais de
500 livros. Nos países da Europa e América do Norte a diferença é entre os dois
extremos é da ordem de 100 pontos, na América Latina é bem menor, em particular no
Brasil e no México, assim como é menor a proporção de famílias com muitos livros
em casa, de acordo com a resposta dos alunos. É possível que famílias de renda
mais alta até tenham livros em casa, mas os alunos não os lêem!
Não é só uma questão de renda, mas de cultura e
valorização de hábitos acadêmicos. As famílias brasileiras precisam mudar de
hábitos para poderem esperar mais de seus filhos do ponto de vista acadêmico e
também para poderem exigir mais do governo!
https://exequi.com/2017/01/16/precisamos-de-uma-sociedade-educogena/