Resumo: O
presente trabalho tem como objetivo apresentar alguns dos principais conceitos
que permeiam a psicanálise, no que se refere à adolescência e os conflitos
envolvidos nessa importante fase da vida humana. Buscar-se-á desenvolver, com
base em uma pesquisa bibliográfica, as relações existentes entre o fenômeno da
adolescência e sua relação com a cultura ocidental contemporânea que tem feito
da juventude, ao longo das décadas, o seu ideal cultural de realização e
felicidade.
Palavras-chave: Adolescência, Psicanálise, Cultura, Sociedade
Contemporânea.
1.
Introdução
Nesse contexto social moderno, percebe-se o prolongamento
da juventude na sua trajetória da infância à vida adulta, e essa realidade vem
ganhando espaço na sociedade brasileira, sendo diversos os fatores que
influenciam para que isso ocorra. Porém, para a compreensão dessa realidade,
primeiramente, faz-se necessário conhecer sua origem, evolução e definir o
conceito de adolescência.
Para o dicionário Larousse Cultural (1999, p. 21), adolescência
se refere à “período intermediário entre a infância e a idade adulta, no curso
do qual a ocorrência da maturidade genital altera o equilíbrio adquirido
anteriormente”. Segundo Bueno (2007), adolescência se refere ao “período da
vida entre a puberdade e a idade adulta (dos 14 aos 18 anos, aproximadamente);
juventude” (p.28).
Diante dos conceitos psicanalíticos, são encontradas
diversas definições sobre a adolescência, dentre as quais, pode-se destacar
Osório (1992), quando afirma que “a adolescência é uma etapa evolutiva peculiar
ao ser humano” (p. 10), destacando que, dentre as diversas características que
diferenciam o ser humano dos animais não pensantes, a adolescência se apresenta
como uma importante etapa evolutiva, além do sentido biológico do ciclo da
vida, onde estão presentes o nascimento, crescimento, reprodução e morte. Para
Aberastury (1990) “a adolescência é um momento crucial na vida do homem e
constitui a etapa decisiva de um processo de desprendimento” (p.15).
2.
O Fenômeno da Adolescência
Em Calligaris (2000) encontra-se que “a
adolescência é o prisma pelo qual os adultos olham os adolescentes e pelo qual
os próprios adolescentes se contemplam. Ela é uma das formações culturais mais
poderosas de nossa época” (p. 09). Em consonância com o que afirma o
autor, identifica-se a visão de Peralva (2007)
Nós sabemos, hoje, que
as idades da vida, embora ancoradas no desenvolvimento biopsíquico dos
indivíduos, não são fenômeno puramente natural, mas social e histórico, datado,
portanto, e inseparável do lento processo de constituição da modernidade, do
ponto de vista do qual ela implicou em termos de ação voluntária sobre os
costumes e os comportamentos, ou seja, naquilo que ela teve de intrinsecamente
educativo (p. 13)
E, justamente por ser um fenômeno cultural, como afirma a
autora, é importante atentar para uma outra questão social, que envolve o
fenômeno da adolescência, abordado por Osório (1992) quando menciona, embora de
modo exagerado que, a adolescência é uma regalia das camadas sociais mais
favorecidas e que tal moratória é privilégio daqueles que não precisam lutar
por sobrevivência. Afirma que estes, no conforto de seus lares, podem
vivenciar, juntamente com os desequilíbrios trazidos ao corpo pela puberdade,
as exigências psicológicas e conflitos internos causados por tais mudanças,
sobretudo pela elaboração das perdas infantis e aquisição das características
adultas. Desse modo, aqueles que não dispõem desse “espaço-tempo” (p. 21), por
terem sido desfavorecidos geográfica e economicamente, precisam dar conta de
tais mudanças psíquicas, sem tantas regalias.
Whitaker (2010) traz a compreensão de que o período
vivenciado pelos jovens, denominado adolescência, não é uma regra fundamental
em todas as culturas, sendo uma construção da sociedade ocidental, visto que,
em outras partes do mundo, a passagem da infância para a idade adulta é
realizada de forma breve, sem complexos, muitas vezes permeada por um rito de
passagem diferenciado culturalmente. Nesse aspecto, Osório (1992) se contrapõe
a tal afirmação, dizendo que sim, que o fenômeno da adolescência é universal,
desde que se compreenda as diferenças existentes nas diversas classes sociais.
Assim, compreende-se que, diferente do que vimos anteriormente, explicitado por
Whitaker (op. cit.), Osório (op. cit.) considera crucial para a vivência da
moratória da adolescência as variações socioeconômicas de determinada região e
não apenas a formação de seus valores culturais.
Na Psicanálise, quando se aborda a temática da
adolescência, uma das questões primordiais presente nessa discussão é, segundo
Aberastury (1981), o desejo-temor de ingressar no mundo dos adultos que
implica, diretamente, na perda da condição infantil. Os lutos vivenciados nessa
fase, também merecem destaque por sua relevância, sendo eles: luto pelo corpo
infantil, luto pelo status de criança e perda dos pais da infância. A autora
aborda ainda uma série de características que integram a Síndrome Normal da
Adolescência. Dela fazem parte: a formação da identidade; formação e participação
de grupos; intelectualização; crises religiosas; pensamentos com
características primárias; desenvolvimento sexual; atitudes sociais
reivindicatórias; contradições no comportamento; alterações de humor e estado
de ânimo; separação progressiva dos pais (ABERASTURY, op. cit.).
Blos (1998) afirma que, na fase da adolescência dois temas
surgem de forma dominante: “o renascimento do complexo de Édipo e o
desligamento dos objetos de amor iniciais” (p. 135-136). Tais fenômenos
sinalizam o surgimento de uma sequência de abandono e procura do objeto, que
impulsionam a necessidade de organização das pulsões em preparação para a vida
adulta.
O autor se refere ainda, quanto aos processos mencionados
acima que, o adolescente vivencia, nessa fase, dois estados afetivos distintos
que são luto e o “estar apaixonado”. Quanto ao luto, há uma perda real, quanto
à renúncia dos pais edípicos (ou luto/perda dos pais da infância, como afirma
Aberastury), com sensação de vazio interior, sofrimento e tristeza. Essa separação
deve ser realizada gradativamente, por ser uma fase psicológica importante e
essencial, porém, não tão fácil de ser elaborada.
O aspecto de “estar apaixonado” é uma conhecida e
característica parte da adolescência. Indica o direcionamento da libido para novos
objetos, trazendo consigo uma sensação de “completeza e abandono singular” (p.
136).
Estando a adolescência, na presente cultura ocidental,
profundamente relacionada às mudanças corporais características da puberdade,
que marcam o início dessa fase, Osório (1992) destaca o surgimento dos pelos,
modificações no comportamento, mudança de voz nos meninos, crescimento das
glândulas mamárias nas meninas, como os principais marcos de que as mudanças
começam a se tornar visíveis. Para o mesmo autor, a adolescência, sobretudo nos
últimos tempos, tem sido considerada um momento de suma importância no
desenvolvimento do sujeito, marcando a composição corporal definitiva, bem como
a estruturação da personalidade.
Alguns dirão que a
adolescência propriamente dita começa um ou dois anos depois da puberdade, pois
esse seria o tempo necessário para que, de alguma forma, o estorvo fisiológico
se transformasse numa espécie de identidade adolescente consolidada. Outros
dirão, ao contrário, que a adolescência começa antes da puberdade, pois essa é
antecipada pela adoção precoce de comportamento e estilos de adolescentes mais
velhos. Seja como for, a puberdade – ano a mais, ano a menos – é a marca que
permite calcular o começo da adolescência (CALLIGARIS, 2000, p. 19).
No entanto, apesar das mudanças corporais e psicológicas
que vão ocorrendo mais ou menos silenciosas, surge um problema relatado por
Calligaris (op. cit.): o não reconhecimento (ainda) desse adolescente como
adulto e a não compreensão, por parte do próprio adolescente, do que é
necessário para chegar a esse almejado lugar.
O autor continua relatando que, não é tão difícil ou, pelo
menos, não deveria ser, compreender que um sujeito que passou doze anos de sua
vida ouvindo, assimilando e se preparando para ingressar no mundo adulto, seja
obrigado a passar por uma longa moratória de quase dez anos, aguardando que a
comunidade adulta o autorize a ingressá-la. Parece óbvio que o argumento da
imaturidade psíquica, levantado pelos adultos, prevaleça sobre a maturidade corporal.
No entanto, não surpreende que, para o adolescente que claramente esbanja seu
vigor juvenil, e a quem muito interessa participar do mundo secreto dos
adultos, esses argumentos não sejam suficientemente convincentes.
Isso leva a pensar que, o que falta a esse não-criança e
quase-adulto, seja justamente encontrar-se, ou seja, formar sua identidade.
Sobre essa questão, Osório (1992) afirma que identidade é, basicamente, a
consciência que o sujeito tem a respeito de si, sua compreensão enquanto ser diferente
dos outros. Não é à toa que o autor menciona a crise da identidade na
adolescência, usando como exemplo os escritos de Anne Frank. Para o
adolescente, tudo o que se forma nessa fase, e que será levado para o resto de
sua vida, se constituem como acontecimentos ora maravilhosos, ora
surpreendentemente negativos. Como é o caso da orientação sexual e identidade
corporal. A labilidade de humor parece refletir justamente essa dualidade.
A formação da identidade que, na maioria das vezes, passa
pela rebeldia e busca pelo engajamento ou formação de novos grupos, é
mencionada também por Osório (1992), mas o autor vai além, quando se refere à
busca pela diferenciação ou, melhor dizendo, uma reedição de tal fenômeno
ocorrido na infância – quando a criança compreende a si mesma enquanto ser
diferenciado da figura materna – assim, o adolescente também busca
diferenciar-se, no sentido de encontrar seu lugar no mundo, perceber-se
diferente dos demais.
É possível que surjam sérios problemas com a definição da
identidade quando as fontes de reconhecimento dessas são externas, ou seja,
fora do seio da família. Nesses casos, o adolescente perde a noção de
identidade, tendendo a se manter ligado à identidade infantil. Isso ocorre com
os adolescentes quando há uma tentativa de rompimento dos laços emocionais
(BLOS, 1998).
Pode-se dizer que a formação de identidade está fortemente
ligada à estruturação egóica do adolescente, que ainda está se adaptando ao
enfrentamento da realidade exterior, bem como aprendendo a conciliar as
exigências de um id significativamente forte e um ego ainda enfraquecido, em
processo de maturação. No entanto, Blos (op. cit.) afirma que o ego adolescente
conseguirá se desenvolver satisfatoriamente se o período de latência for
atravessado de maneira saudável, cujas realizações precisam seguir o percurso
do aumento da catexia dos objetos interiores, aumento da capacidade de
resistência à regressão, formação de um ego autocrítico que apoie as funções
superegóicas, no intuito de regular a autoestima para que essa atinja certo
grau de independência do ambiente, melhora da expressão verbal independente da
função motora, domínio do ambiente por meio do aprendizado e do uso do processo
secundário, que visa reduzir a tensão.
O fim da adolescência caracteriza-se como um declínio
natural num acentuado e conflituoso crescimento. Porém, embora concluídas as
etapas de crescimento e maturação biológica, as únicas características que
sinalizam de modo definitivo a conclusão real dessa fase, são as de ordem
psicológica (BLOS, op. cit.).
Compreendendo que o produto final da adolescência é a
formação e estruturação da personalidade, ao que Blos (1998) denomina caráter,
é importante observar que, para tal consolidação, aquele que agora se encontra
na fase final da adolescência, deve ter atingido a estabilidade do ego. Sendo
relevante ainda, segundo o mesmo autor, que haja uma definição da orientação
sexual, com primado genital, onde as pulsões devem ter chegado a um estado de
permanência.
Porém, o fim da adolescência não significa dissolução
completa dos conflitos, mas esses se tornam específicos e passam a ser melhor
administrados na esfera do ego. Este, por sua vez, encontra-se estabilizado e
alinhado às exigências exteriores, o que dá ao agora jovem, maior competência
psíquica, por assim dizer, para que as demandas instintuais tenham sua
satisfação de modo mais harmônico e menos caótico, como geralmente ocorre no
período da adolescência propriamente dita (FREUD, 2006).
Numa perspectiva social/educacional, Zagury (1999) também
se refere ao fim da adolescência e a entrada definitiva no mundo adulto quando
o indivíduo, finalmente, se percebe capaz de assumir as próprias
responsabilidades sem o apoio dos pais/cuidadores, em todos os aspectos. No
entanto, segundo a autora, na sociedade ocidental contemporânea, tem surgido um
entrave nessa linha de chegada do mundo adulto: o atraso na formação
profissional. Isso ocorre porque os jovens têm demorado cada vez mais para
concluir os estudos acadêmicos, sobretudo devido à “necessidade” de
pós-graduações e formações complementares exigidas pelo mercado de trabalho.
Ela afirma, no entanto, que de modo geral, nas camadas mais
pobres, a adolescência tende a chegar a sua fase final um pouco mais cedo,
visto que os jovens precisam trabalhar para ajudar a família, ingressando mais
cedo no mercado de trabalho e assumindo novas responsabilidades e,
consequentemente, amadurecendo. Nesse sentido, a autora se assemelha ao que
afirma Osório (1992), quando diz que os jovens mais abastados acabam tendo
algumas regalias no processo de crescimento.
Zagury (1999) atribui ainda aos pais uma grande parte da
responsabilidade sobre a idade em que os jovens se sentem prontos para encarar
o mundo de forma madura e responsável. Segundo a autora, é importante que os
pais incentivem os adolescentes a assumir algumas responsabilidades no decorrer
de seu processo de crescimento, de acordo com sua capacidade e aptidão para
tal. Isso lhes auxiliará na percepção e compreensão das atividades cabíveis, a
serem desempenhadas por eles, fazendo com que se sintam cada vez mais
responsáveis e competentes para realizarem tarefas diversas.
Assim, a chegada do adolescente à vida adulta é, na
verdade, o fim de um processo de formação construtiva, desenvolvido durante os
longos anos da infância e adolescência. Processo esse que culmina na maturidade
de um ego equilibrado e suficientemente pronto para lidar com as demandas de um
mundo real e exigente, bem menos compreensivo que o, até então conhecido,
âmbito familiar.
3.
Adolescência Estendida e Sua Relação com a Sociedade Contemporânea
Quando a adolescência, que tem em si mesma a finalidade de
amadurecimento após uma fase transitória, se torna contínua, interminável, como
um ciclo aberto, dá-se a esse fenômeno o nome de adolescência prolongada ou
estendida, cujo termo foi introduzido por Bernfeld em 1923. O foco de seus
estudos foi o prolongamento da adolescência masculina, observado na Europa após
a Primeira Guerra Mundial (BLOS, 1998).
Aqueles que se encontram nessa fase, recusando-se a
vivenciar as decisões e conflitos finais da adolescência, adiando o caráter
decisivo e formativo desse período, acabam tornando a adolescência seu modo de
vida, recusando-se a ingressar à vida adulta.
(...) as funções do
ego – pensamento, memória, julgamento, concentração, observação – são
prejudicadas por duas fontes, ou seja, por uma inundação de pulsões sexuais e
agressivas, e por uma ascendência de funções arcaicas do ego e defesas
primitivas. O adolescente recua para os modos anteriores de controle da tensão;
isso revela que o período de latência realizou apenas progressos reduzidos no
desenvolvimento do ego (BLOS, 1998, p. 296).
O autor continua e afirma que o fenômeno da adolescência
prolongada “resguarda” o indivíduo e evita que ele vivencie a crise que o leva
a perceber que, diferentemente de sua família, o mundo não é igualmente
generoso e agradável, pois não reconhece no adolescente o papel que o mesmo
tentou desempenhar anteriormente, mostrando-se muitas vezes tirânico e
incompreensível. Nessas circunstâncias, o adolescente recua, permanecendo
vinculado à identidade infantil, um lugar que lhe parece mais confortável.
Respaldado pela família que parece assegurá-lo de quem ele é, embora a partir
de uma visão distorcida, assumindo o lugar não do que é, de fato, mas do que os
outros acham que ele é (BLOS, op. cit.).
Zagury (1999) menciona o fenômeno da adolescência estendida
fazendo uma alusão há décadas anteriores, quando os jovens tinham pressa em
sair de casa e assumir responsabilidades próprias, no intuito de viver a
liberdade que não tinham na casa dos pais. Na realidade atual, com a excessiva
liberdade que os adolescentes adquiriram, aparentemente como uma recompensa das
lutas de seus pais no passado, pelo direito de serem livres e viverem a
autonomia, os jovens contemporâneos passaram a retardar a saída da casa dos
pais, pois vivem em seus quartos como se fosse sua própria casa. Nessas
condições, eles têm o respeito dos membros da família, privacidade, trazem os
namorados para casa e podem alegar, sem maiores problemas, que não querem ser
incomodados quando se irritam ou não desejam falar com ninguém. Assim, a autora
questiona: “para quê sair de casa?” (ZAGURY, 1999, p. 22), se toda liberdade
pode ser ali vivenciada.
Outra característica que compõe e agrava essa realidade
social atual é a das famílias de classe média e alta, onde os
adolescentes/jovens, na maioria das vezes, não contribuem com as despesas da
casa, nem se envolvem nas tarefas domésticas, tendo por obrigação apenas
estudar. Isso retarda o amadurecimento e os permite gozar e desfrutar, por
longos períodos, dos bens de sua família, do conforto de suas casas, sem que
haja ônus à adorável vida confortável e livre que lhes proporcionam os pais
(ZAGURY, op. cit.).
Com isso, tudo parece se tornar mais confuso, a medida em
que os pais e os próprios adolescentes “querem-mas não querem” que essa tal
adolescência termine. E a adolescência vai-se prolongando e tendo seu final
empurrado para os trinta anos, ou mesmo se tornando o próprio ideal cultural
contemporâneo, mencionado por Calligaris (2000, 2009).
O fenômeno da “adultescência”, comentado por Calligaris
(2009), parece bastante pertinente ao que vem sendo discutido até aqui. O autor
menciona que, não somente os adolescentes retardam a sua entrada no mundo
adulto, mas também os já adultos e pessoas de meia idade se veem tentados a
reviver a adolescência, diante do que ela proporciona de mais belo: a sensação
de eterna juventude e liberdade.
Com as evoluções ocorridas nesse mundo, diante das
melhorias atingidas sobretudo no âmbito da saúde, a longevidade tem se tornado
cada vez mais comum. De modo que, recolher-se aos aposentos, após a conclusão
de uma carreira profissional e do cumprimento dos deveres parentais já não faz
sentido, nesta sociedade contemporânea. Com isso, não é difícil entender os
termos usados por Calligaris (op. cit.), em relação a “estar adolescente”. A
terceira idade já não é sinônimo de proximidade da morte, oferecendo agora,
novas possibilidades de ser. E, nesses termos, o que se deseja ser?
Adolescente!
Cabe então a curiosidade de refletir sobre uma adolescência
que, apesar de abarrotada de conflitos, mudanças drásticas e dores de
crescimento, uma fase em que os sujeitos que a constituem são rejeitados por
desejarem ingressar em uma realidade que ainda não os cabe, ainda se mostre
para a cultura ocidental contemporânea, como um ideal de vida. É um paradoxo,
conforme afirma Calligaris (2000). Mas o mistério de tal contradição é
desvendado pelo autor, uma vez que, o desejo dos adultos é a liberdade ou, por
assim dizer, rebelar-se. Nisso, os adolescentes são mestres: transgredir!
A adolescência surgiu então com o objetivo de fomentar um
ideal necessário, contemplado pelos adultos? Um lugar onde existe liberdade
individual e despreocupada, aliadas à desobediência, como encenação de um mundo
permissivo, ainda que da ordem do imaginário? Questiona Calligaris (2000).
Os adolescentes, por sua semelhança física com os adultos,
oferecem maior possibilidade de identificação, “pois é propriamente uma imagem
de nós mesmos gozando, felizes, sem impedimentos ou quase” (CALLIGARIS, op.
cit., p. 70).
E sobre os conflitos? O próprio Calligaris (2009) diz que,
não importa se essa tal adolescência é idealizada ou perseguida, pois reafirma
que independente da forma como se apresenta, ainda é, enquanto fenômeno ou
condição de vida, uma hipervalorização da liberdade e da possibilidade de ser o
que quiser, com o direito, quase disfarçado de dever, de rebelar-se. E, ao
finalizar seu texto, não propõe soluções ou atitudes que levem a uma possível
resolução dessa constante mas, ao contrário, aconselha os leitores a seguir o
fluxo e, assim como o próprio afirma: “seguir adultescendo”.
4.
Considerações Finais
No decorrer do artigo, buscou-se apresentar alguns
conceitos sobre a adolescência, diante de suas peculiaridades, desenvolvimento
e conflitos iminentes. Percebeu-se ainda que, existem divergências quanto ao
período da adolescência propriamente dita, bem como, acerca desse fenômeno que
percorre um caminho paradoxal e tênue entre cultura, biologia e psiquismo.
Quanto a isso, concluiu-se que é impossível analisar a adolescência
observando-a apenas de um desses âmbitos, sobretudo por compreender que o
adolescente se desenvolve, quase que simultaneamente, em todos os contextos
anteriormente citados, buscando atingir a maturidade psicológica, dentro de um
corpo biológico preparado para ingressar no mundo adulto, mostrando-se capaz de
exercer seu papel cultural e social com habilidade e competência.
No entanto, viu-se que a cultura ocidental tem contribuído
para que a adolescência se torne um período de moratória cada vez mais longo,
refletido no tempo que esses jovens levam para deixar a casa dos pais e assumir
responsabilidades significativas para sua independência. Nesse sentido, as
diferenças culturais, no ambiente socioeconômico, trazem modificações ainda
mais expressivas quanto à vivência dessa fase e, consequentemente, de seu
término.
A adolescência, além de seu significado complexo para a
vida do indivíduo e de sua família, tem se tornado um ideal cultural
contemporâneo, o que também contribui para o seu prolongamento. Ser
“eternamente jovem” e livre, parece ser o desejo máximo da sociedade atual e
isso fica explícito no modo como a juventude é vista até por aqueles que, há
tempos, saíram dessa fase agridoce da vida.
Enfim, não há dúvidas de que a adolescência, apesar dos
tropeços, é uma fase bela e importante do desenvolvimento individual e não foi
à toa que se tornou um momento invejável da vida. Porém, é preciso vivê-la bem,
em seu devido tempo, visto que é uma fase decisiva para a formação da
identidade, tendo como produto – de uma adolescência saudável – a estruturação
do ego e o fortalecimento da capacidade de lidar suficientemente bem com a
realidade externa.