Em minha tese de doutorado intitulada “(Pré)-escola, cidade, famílias: produção de comunidades de sentido em cadeias ritualísticas de interação (1980-1999)”, investiguei a relação entre (pré)-escola, cidade e famílias em Blumenau. Parti do suposto que na colonização da cidade, no desmembramento da Grande Colônia, no período das grandes guerras, no Estado Novo e na reconfiguração vivida por Blumenau, no período 1980-1999, a elite local, a mídia impressa, o marketing turístico e gestoras de uma escola confessional católica, tida como tradição e referência na cidade, trabalharam para disseminar social e pedagogicamente o slogan “um pedacinho da Alemanha no sul do Brasil”. Essa auto-imagem da cidade foi ardilosamente desenhada, projetada, consolidada e perpetuada na cidade e na escola. No trabalho de conformação da infância em torno dessa auto-imagem, as estratégias pedagógicas usadas por excelência foram festividades culturalmente fundadas e reiteradas por gerações nos clubes de caça e tiro blumenauenses: a festa de rei e rainha, o desfile do aniversário da cidade e mais recentemente, da década de 1980 em diante, a oktoberfest. As professoras da escola, assim como a produção cultural da cidade e as expectativas das famílias de classe média e classe média alta criaram um sentimento de pertença de superioridade moral, de melhor, de cidade forte. Esses indivíduos articularam-se em torno de um cenário de fachada, qual seja, Blumenau como cidade alemã, cidade jardim, cidade de povo trabalhador, aguerrido. Esse sentimento de superioridade foi transposto didaticamente para o interior da (pré)-escola, notadamente no período 1980-1999, quando as crianças que a freqüentavam eram conformadas num cenário em que o catolicismo pedagogizado disputava status, valor e importância com atividades escolares pautadas no habitus germânico, na formação de modos de ser, sentir, pensar e agir manifestos e consolidados no estigma do que é ser blumenauense, teuto-brasileiro, num “pedacinho da Alemanha no sul do Brasil”: ordeiro, limpo, trabalhador, empreendedor, moralmente superior na sua força de trabalho e capacidade de prosperar na vida. A relação escola, cidade e famílias é, antes de tudo, uma prática social que, no cotidiano blumenauense e nas formas culturais escolares, consolida um sentimento de pertença em torno da tradição germânica que se quer transmitir para outras gerações. Julice Dias é Doutora em Educação: História, Política, Sociedade, pela PUC/SP e professora da UDESC)
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