quarta-feira, 22 de setembro de 2010

FEBRE MACULOSA BRASILEIRA

Por Fernanda Marques

A Fiocruz já concluiu e encaminha ainda nesta terça-feira (1º/11) os resultados preliminares da bateria de testes sorológicos feitos com amostras de sangue de três pessoas com suspeita de terem contraído a febre maculosa recentemente, no Estado do Rio de Janeiro. Esses primeiros resultados serão enviados para as instituições que solicitaram os exames: o Departamento de Controle de Zoonoses da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, a Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde e o Hospital São Lucas. A Fiocruz não divulga para o público os resultados, já que esta decisão é de responsabilidade das instituições que solicitaram os exames. Na próxima sexta-feira (04/11), às 10h, o Centro de Estudos do Instituto Oswaldo Cruz promoverá uma palestra com os pesquisadores José Rodrigues Coura e Elba Lemos sobre a febre maculosa. Nesta segunda-feira (31/10), cientistas da Fiocruz deram uma entrevista coletiva para explicar o que é a enfermidade. A coletiva teve as presenças de Coura, Elba e Anthony Érico Guimarães.

Depois dos mosquitos, os carrapatos são os principais vetores de doenças. E entre as doenças que podem ser transmitidas por carrapatos se destaca a febre maculosa. A doença foi descrita pela primeira vez em 1899, nos Estados Unidos. No Brasil, o primeiro caso foi identificado em 1929, em São Paulo. De lá para cá, a febre maculosa foi registrada em outros estados, como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e Santa Catarina.

A febre maculosa pertence ao grupo das rickettsioses, doenças causadas por rickettsias - pequenas bactérias que, obrigatoriamente, atuam como parasitas intracelulares e que são transmitidas por artrópodes como as pulgas, os piolhos e os ácaros, além, é claro, dos carrapatos. Esses artrópodes se nutrem de sangue e, para conseguir seu alimento, picam animais como cavalos, bois, cães e roedores. É no momento da picada, através da saliva, no caso dos carrapatos, ou das fezes infectadas, no caso das pulgas e piolhos, que transmitem as bactérias. "As rickettsioses são zoonoses, isto é, doenças que acometem animais e o homem. Mas este só entra no ciclo por acidente, ao ser picado por um artrópode infectado", explica a médica e pesquisadora Elba Sampaio de Lemos, coordenadora do Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fiocruz.

Bactérias da espécie Rickettsia rickettsii são as causadoras da febre maculosa. A doença, em geral, provoca febre alta, dor de cabeça e lesões na pele semelhantes às do sarampo ou da meningite meningocócica. Mas ela pode se manifestar das mais diferentes formas, já que R. rickettsii infecta células do endotélio (revestimento interno) de vasos sangüíneos. "Como há vasos por todo o corpo, praticamente qualquer órgão pode ser afetado", diz Elba. O paciente pode apresentar um quadro clínico que simula pneumonia, apendicite ou meningite, por exemplo.

Os primeiros sintomas da febre maculosa levam, em média, de sete a dez dias para se manifestar. Depois que eles aparecem, o tratamento - que consiste basicamente no uso de antibióticos - deve ser iniciado dentro de no máximo uma semana. Caso contrário, é grande o risco de os remédios não surtirem o efeito desejado. O problema é que, como a febre maculosa costuma ser confundida com outras doenças, o diagnóstico correto e, conseqüentemente, o tratamento adequado, muitas vezes, demoram. "Se a doença não for devidamente tratada, a letalidade pode chegar a 80%", lamenta a médica.

Até existe uma vacina contra a febre maculosa. Porém, a febre maculosa não apresenta um perfil de doença imunoprevisível, isto é, de doença na qual se deva indicar a vacinação. E, além do mais, vacinar todo mundo é inviável, pelo menos por enquanto. O essencial, portanto, é apressar o diagnóstico, já que o tratamento é simples. "Antibióticos baratos reduzem significativamente a taxa de letalidade, desde que comecem a ser tomados a tempo", garante a pesquisadora.

No Brasil, a febre maculosa é transmitida por carrapatos do gênero Amblyomma, encontrados em praticamente todo o território nacional. No entanto, nem todas as pessoas picadas por esses insetos ficam doentes. "Só há risco de a doença se manifestar caso o carrapato esteja infectado pela R. rickettsii e fique fixado à pele da pessoa por no mínimo cerca de quatro horas", lembra Elba.

Cada fêmea de carrapato infectada pode gerar até 16 mil filhotes aptos a transmitir rickettsias. A febre maculosa é mais comum entre abril e outubro, porque nesse período predominam as formas jovens do carrapato. "Como elas são menores que os adultos, passam despercebidas, conseguem ficar fixadas à pele das pessoas por mais tempo e, portanto, têm mais chance de transmitir as bactérias", explica a médica.

Se não for possível evitar áreas infestadas por carrapatos, é importante usar calças compridas e blusas de manga, assim como verificar constantemente se algum deles grudou na pele. Afinal, o risco de se contrair febre maculosa diminui de forma acentuada se os artrópodes são imediatamente removidos. Mas é preciso cuidado na hora de removê-los. Tem gente que encosta a cabeça de um fósforo ainda quente no carrapato para forçá-lo a se soltar. "Isso não é aconselhável: o estresse sofrido pelo artrópode faz com ele libere grande quantidade de saliva, o que aumenta as chances de transmissão de rickettsias", alerta a pesquisadora.

Fernanda Marques - E-mail




 

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